quarta-feira, 5 de maio de 2010

Programem-se, ou não...

por Alice Birchal

Voltando ao mundo com a pílula, penso que a liberdade sexual que ela proporciona tem seu lado positivo e negativo, como, aliás, tudo na vida.

Primeiro, estabelecemos metas: só nos fixarmos sentimentalmente quando houver maturidade profissional e independência financeira, apartamento pago e montado, telefone, carros, tudo material, antes de formar família. Quando tudo estiver bem com o casal, engravidar e ter dois filhos.

Ou seja, nada de surpresas. Então, depois de graduação, mestrado, doutorado, maturidade, equilíbrio financeiro e emocional (será?), a gravidez tão programada. Passados dois anos, a segunda gravidez programada. Essa é a fórmula da maioria dos casais da classe média (nossa burguesia): programar-se. Será que vale a pena?

Como estou no 8º mês de minha 2ª gestação programada, por assim dizer e, portanto, serei mãe de duas meninas, algumas reflexões vêm me ocorrendo. Como complicamos a gestação e o nascimento! Isso a partir da pílula e das inúmeras modernas possibilidades de contracepção.

Novamente estou às voltas com quartos, decoração, rearranjos de armários, espaço no apartamento para duas meninas, lavagem de enxoval com sabão de coco, babás, ufa! Claro, sem a participação masculina. E a frase que a todo o tempo escuto das pessoas: “bebê é uma bênção”, “faço tudo por meus filhos”... Será?

O que isso tem a ver com a pílula? Tudo.

Sou filha da 7ª gestação de uma sequência de cinco mulheres, um homem e, então... eu, outra menina! Não é queixa, apenas constato que fui criada no “vácuo” dos meus seis irmãos, ou seja, nada de gravidez programada, quarto, decoração, armário, espaço para mim, enxoval, muito menos sabão de coco, babá? Ah..., claro a única coisa em comum: em regra, nada de participação masculina, a não ser no ato (sabem qual, né?).

Com a pílula a filiação deixou de ser uma surpresa. Hoje, programamos tudo que está ao nosso alcance. Mudamos a maneira de criar os filhos: antes éramos criados no grupo denominado “nossos filhos” e dividíamos tudo. Hoje, criamos nossos filhos quase como filhos únicos e isso tem resultado em crianças egoístas, individualistas, consumistas demais, porque os tratamos como príncipes e princesas que devem ter tudo que o dinheiro pode comprar, mas, nós, os pais, não somos reis, não vivemos em reinos e não podemos protegê-los para o resto de suas vidas.

Criamos o discurso que só podemos ter dois filhos por questões financeiras, porque só podemos dar tudo a dois, não a sete...

É isso mesmo ou apenas queremos o conforto de dois filhos, menos preocupações? Criamos tantas “necessidades” desnecessárias que já não sabemos se realmente educar filhos é tão caro assim.

Pensando no passado: nunca fui triste por dividir as coisas, o espaço e ser criada no “vácuo” dos meus irmãos. Acho que sem tanta programação e sem tantas necessidades materiais éramos mais felizes...

2 comentários:

  1. Não sou mãe, nem sei se um dia pretendo ser, mas concordo plenamente.

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  2. Sim, hoje em dia as mulheres (pelo menos, grande parte) não mais vê a vida como "casar, servir ao cônjuge, procriar e viver a vida em função da família).Sou bem nova, não pretendo ter filhos tão cedo, e me julgam mal por isso, pois a sociedade está presa a essa concepção de que mulher tem que casar e ter filhos.

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