domingo, 27 de junho de 2010

Vingindade ainda existe?

entrevista de Katia Thomaz com a Dra. Néli Sueli Teixeira de Souza, ginecologista e obstetra


- O tema "virgindade" foi totalmente abolido do vocabulário leigo e profissional?


Dra. Néli - O tema ainda não está abolido, mas a cada dia é menos pronunciado.


- A mulher e o homem ainda se preocupam com a virgindade?


Dra. Néli - A mulher hoje não tem mais orgulho de ser virgem e não se sente inferiorizada ou ameaçada quando inicia sua vida sexual antes do casamento. Muitas o fazem sem o conhecimento da família. Em alguns casos a mãe é conivente, mas o pai é "poupado", porque não aceita ou, talvez, porque ainda não saiba lidar com essa situação. Prefere, vamos dizer, fingir que não está entendendo o que está acontecendo, para não ter que tomar atitude. Algumas, mais maduras, têm até vergonha de serem virgens, como se isso fosse um atestado de abandono. Aprenderam que deveriam se guardar, mas o tempo passou... o príncipe não chegou e a virgindade ficou demodê. Entretanto, ainda existem mulheres que, por valores culturais ou religiosos, "se guardam para o marido". Em se tratando de religião, pelo menos no nosso meio, a única que prega a virgindade de homens e mulheres e que parece atingir algum objetivo é a Batista.


- A nova paciente é questionada sobre a virgindade? Os procedimentos são diferentes?


Dra. Néli - Durante a consulta a virgindade é questionada para se saber como examinar, que doenças prevenir ou suspeitar, etc. Por exemplo, não se realiza prevenção do câncer do colo uterino em virgens, porque para isso seria necessária a colocação de um espéculo, procedimento que poderia lesar o hímen. Além do mais, as virgens não possuem risco para esse tipo de doença.


- Há algum estudo recente sobre o assunto?


Dra. Néli - Não tenho estudos novos sobre o assunto, mas acho interessante pesquisar.


- Há notícias recentes sobre "plástica de reconstituição do hímen" (vide caso Ângela Bismarchi). Qual a sua posição a respeito?


Dra. Néli - A reconstituição do hímen é uma cirurgia fadada ao fracasso. Os resultados não são bons (o hímen praticamente não pode ser reconstituído). De minha parte, nunca estimulei, nunca realizei e contra-indico esse procedimento, por considerá-lo, além de inútil, ineficaz. Gostaria de conhecer o "caso da Ângela Bismarchi", pois não o acompanhei. Parece-me ser, mais uma vez, uma auto-promoção... Mas poderíamos perguntar a ela: O que isso muda?

domingo, 20 de junho de 2010

A mulher no núcleo familiar moderno

por Mônica Dias


Anos atrás a maioria das mulheres se casavam por amor ou imposição familiar ou porque não conseguiam absorver a hipótese de não se casarem simplesmente. Nesses casos a mulher era dona de casa, quase não tinha opções para trabalhar, ser ouvida, planejar o número de filhos ou poder simplesmente ter vários relacionamentos, porque isso implicava em ser rotulada como uma mulher sem valor.


O feminismo alterou essa relação da mulher com a sociedade em diversos aspectos. Ela passou a ter direitos legais como o direito de votar e o direito a utilização de contracepção, direito à proteção de seu corpo e moral que se relacionam a violência doméstica, assédio sexual e estupro, dentre outros.


Nas relações mais modernas as mulheres não se casam mais pelos motivos citados, mas por decisão própria e querem participar da sociedade e tomar decisões sobre os vários assuntos do seu lar, participar ativamente do mercado de trabalho, serem valorizadas enquanto mulheres, profissionais e cidadãs. No início isso se tornou um complicador, pois todas as tarefas do lar continuavam sendo de sua única responsabilidade e ainda se sobrecarregava com as demais obrigações que sua maior liberdade acarretou.


Como a sociedade lhe negou por muitos anos direitos fundamentais a sua existência atual, podemos ver que o núcleo familiar vem se alterando a cada ano que passa. Participar do núcleo familiar é se tornar co-responsável tanto pelo sustento como pela educação, saúde, desenvolvimento de valores morais e religiosos da família que tinham como único responsável o homem.


Nessa dinâmica mudança temos o advento e facilidade de se finalizar os casamentos com o divórcio, a violência que chega cada dia mais perto de nossas casas, a visível decadência dos valores morais e religiosos, a desvalorização da família, assim vemos que forçosamente ou não, nos diversos níveis socioeconômicos a mulher se torna o centro do núcleo familiar não só uma parte desse núcleo, fato inimaginável anos atrás.


Essas mudanças são reflexos de hoje podermos escolher parceiros e maridos, a não aceitação de sermos objetos meramente decorativos nos lares, do planejamento familiar, de diálogo entre os parceiros e de sermos parte importante da sociedade.


As famílias têm sofrido mudanças ao longo dos anos mas é inegável que a mulher teve papel fundamental nessas mudanças.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Deixo a vida me levar...

por Natália Brunacci


Eu presenciei mudanças importantes na mineração em que eu trabalhava no interior de Goiás. Fui a primeira geóloga, mas em pouco tempo vi outras chegando. E uma conquista importante: a mineração abriu vagas para as mulheres na mina, operando equipamentos. Cada vez que uma notícia dessas chegava ao escritório, eu vibrava enquanto meus “colegas” faziam piadas. Entre uma piada e outra, nós fomos conquistando nosso espaço.


Não posso contar no que deu essa história, porque bateu um vento-sul e, quando percebi, eu já estava atravessando metade do globo rumo à Austrália, onde seria meu próximo emprego. Vim direto pra Kalgoorlie, uma cidadezinha movida à mineração no meio do deserto australiano. Geóloga, solteira e brasileira, seria eu, aqui na Austrália, um animal ainda mais exótico?


Não.


Aqui as mulheres já estão integradas no ambiente de mineração. Eu não fui a primeira geóloga, nem a única. Geólogas, engenheiras, auxiliares de campo, mineradoras, operadoras de equipamentos, técnicas em explosivos, motoristas de caminhão (aqueles caminhões gigantescos!): aqui as mulheres ocupam vários cargos outrora considerados “masculinos”. Existem, ainda, várias organizações que promovem a inserção e manutenção da mão de obra feminina na indústria de mineração.


Eu imagino que a questão da disponibilidade de mão de obra tenha sido um fator determinante na inserção feminina na indústria de mineração. A Austrália é um país quase tão grande quanto o Brasil, com uma população de aproximadamente 22 milhões (compare isso com os 192 milhões do Brasil). Como diz o ditado: "A necessidade aguça o engenho"!


A maior participação feminina, porém, não faz o ambiente menos masculino. Kalgoorlie, por exemplo, funciona para os homens. Aqui, os bares ficam abertos 24 horas para que esses pobres trabalhadores, após um árduo turno de trabalho, possam desfrutar de uma cerveja gelada servida por uma garçonete topless (a famosa “skimpie”). As mulheres, geralmente, vão para casa encarar mais uma jornada.


Empregada, babá e creche são luxos caríssimos na Austrália. O mais comum é que as mulheres, após terem filhos, passem a trabalhar meio período ou abandonem a carreira para cuidar da família. Eu, particularmente, não conheço nenhuma mulher com mais de um filho que trabalhe período integral (fora de casa, porque em casa eu sei que elas trabalham - e muito!).


Mesmo assim, parece ser senso-comum a opção pela família. Freqüentemente eu vejo no supermercado jovens mães cercadas por uma penca de filhos, o que me faz pensar: “Será que está na minha hora de contribuir com a perpetuação da espécie?”


Enquanto eu não decido, eu deixo a vida me levar...

domingo, 13 de junho de 2010

Igual, pode ser. Melhor, ainda não...

por Natália Brunacci


Eu me considero uma pessoa desprendida. Não tenho medo de mudanças, reestruturações ou recomeços. Minhas ambições e planos sempre foram globais, como diz a minha irmã, eu sou “do mundo”. Por sorte escolhi uma profissão adequada à minha inquietude: sou geóloga. Hoje a minha opção de vida é desfrutar de tudo que a minha profissão tem a me oferecer. Amanhã, se eu decidir constituir família, já é outra história.


Assim que eu me formei em geologia, arrumei um emprego em uma empresa de mineração numa cidadezinha do interior de Goiás. Sem saber o que me esperava, juntei minhas tralhas, despedi-me da mordomia de BH e fui...


Eu era a primeira geóloga mulher da empresa, E em uma cidadezinha movida à mineração, geólogo é “doutor”. Havia também outras mulheres trabalhando lá, mas todas em cargos administrativos, e a maioria delas era casada. Geóloga e solteira, isso fazia de mim um animal muito mais exótico!


Devo admitir que sempre fui respeitada no meu ambiente de trabalho, principalmente pelos funcionários supervisionados por mim, graças à hierarquia empresarial. As piadinhas, por incrível que pareça, vinham das pessoas do meu patamar, ou seja, dos meus “colegas”. Machismo disfarçado de piada.


Muito trabalho, conquistas concretas e mensuráveis e constante auto-afirmação. Independente das vitórias profissionais, o respeito só era conquistado no bar! Meus amigos falavam com orgulho: “A Natália bebe igual homem!”. Mais uma afirmação preconceituosa, porque na verdade eu deixava todos os meus “colegas” no chinelo quando a disputa ia para a mesa do boteco, e mesmo assim eu nunca ouvi um “A Natália bebe muito mais que qualquer homem!”. Puro desperdício de fígado!

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Uma pessoa de sorte!

por Natália Brunacci


Eu sou a caçula de uma família pequena, programada graças à pílula. Pai, mãe, duas filhas. Acho que posso dizer que sou cria da emancipação feminina, ou seja, eu já nasci emancipada! Claro que é porque eu dei sorte de cair nessa família! Faz toda diferença ter pais informados, politizados, atualizados e críticos.


É claro que a pílula foi fator determinante na evolução do comportamento sexual desde a juventude dos meus pais até a minha juventude. E vai continuar sendo para todas as outras gerações que estão por vir! E, vamos combinar, que o comportamento sexual desde a revolução mudou muito, e muito rápido! Tão rápido, que na minha adolescência é que eu fui perceber que meus pais estavam mais perdidos do que “cego em tiroteio”!


Eu me lembro que, quando voltava de escola de carro com a minha mãe, no trânsito infernal de Belo Horizonte, ela fazia discursos e mais discursos sobre camisinha, AIDS, gravidez, que eu tinha que me cuidar cuidar, blá blá blá... tudo que eu queria era pular para fora do carro no primeiro sinal e sair correndo!!! O engaraçado é que nunca me ocorreu de simplesmente dizer “Alooouuu, eu sou virgeeemm!!!!”.


E quando a gente falava “fiquei com o fulano” eles arregalavam um olhão. Não sei o que meus pais achavam que acontecia quando eu ficava com alguém, mas eu posso garantir que a imaginação deles ia muito além dos beijinhos inocentes atrás da escada.


Quando eu tinha 14 anos, minha professora mandou ler o livo Namoro - Relação de amor e sexo, do Flávio Gikovate. Meu pai tarabalhava no centro, então pedi que ele comprasse o livro pra mim. Quando chegou em casa do trabalho, ele me entregou o livo com um sorriso e falou: “Isso mesmo, minha filha! Cê tem é que ficar mesmo!”. Aconteceu que, durante a volta para casa, meu pai começou a ler o livro no ônibus, aí ele entendeu que o ficar era uma coisa saudável, que eu estava só descobrindo a minha sexualidade.




Passado o baque inicial da “tempestade hormonal” do início da adolescência, meus pais, minha irmã e eu aprendemos a nos entender e a respeitar nossas escolhas afetivas e sexuais. A gente apresentava um outro namorado, mencionava um ou outro ficante. Quando o telefone de casa tocava, se eu não corresse pra atender, eu pedia para minha mãe dizer que eu não estava. Minha mãe me encobria, meu pai achava uma sacanagem!

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Navegando em águas tranquilas

por Maria Izabel Brunacci

(Professora de literatura brasileira, autora da livro Graciliano Ramos, um escritor personagem e escritora no blog PedraPalavraVoz. Mãe de Angélica e Natália. Avó de Sofia e Laura)


Hoje, temos já certo distanciamento crítico para fazer a avaliação do impacto da pílula anticoncepcional na vida das mulheres. É possível dizer que melhoramos em relação a nossas avós, mães e tias? Claro que sim. Nós aprendemos não apenas que podemos ser donas de nossos corpos e nossos desejos, mas também lutamos cotidianamente para criar as condições de exercer essa liberdade.


Será que a sociedade mudou também, na mesma proporção que as mulheres protagonistas do início desse processo de liberação? Quanto a isso, tenho minhas dúvidas. Como todo processo histórico, as mudanças no Brasil ainda estão em curso, com avanços e retrocessos. Na mudança do milênio, houve aumento do misticismo e da religiosidade, denotando a desaceleração das mudanças e o aumento do conservadorismo.


Políticas de saúde pública foram implantadas, propiciando o acesso de um maior número de mulheres, de todas as classes sociais, aos métodos contraceptivos, principalmente a pílula anticoncepcional. Há maior preocupação do poder público com o planejamento familiar, mas em relação tensa com a igreja e com grupos conservadores, contrários à descriminação do aborto. (Se você quiser conhecer os componentes da política pública de planejamento familiar, visite o sítio http://portal.saude.gov.br/portal/saude/area.cfm?id_area=152 )


Pois então. As conquistas femininas no mundo pós-pílula são, também elas, parte de um processo maior em que diferentes grupos lutam pela emancipação na sociedade. Certamente os efeitos dessas mudanças serão diferentes para as mulheres ricas e para as mulheres pobres, para as brancas e as negras, para as religiosas e as agnósticas. Porque, no fundo, o contexto em que se dá a luta por essas conquistas é o solo da sociedade capitalista, em que cada avanço, individual ou coletivo, coloca em risco um setor produtivo, que a ele resiste.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Não há emancipação pacífica

por Maria Izabel Brunacci

(Professora de literatura brasileira, autora da livro Graciliano Ramos, um escritor personagem e escritora no blog PedraPalavraVoz. Mãe de Angélica e Natália. Avó de Sofia e Laura)


Nenhum processo emancipatório é pacífico. Com a liberação feminina não foi diferente. Em uma sociedade sexista, com o predomínio do poder masculino a submeter as mulheres, não poderia faltar o conflito.


Pelos mais diferentes motivos, as mulheres ousaram abandonar maridos e reivindicar a guarda dos filhos. A reação a esses voos de liberdade é sempre violenta. Os crimes passionais tiveram verdadeira escalada nos últimos 30 anos, aparentemente na mesma proporção em que cresceu o número de mulheres que decidiram se emancipar.


Ainda na década de 1970 surgiu nos meios jurídicos a tese da “legítima defesa da honra” para justificar os assassinatos de mulheres pelos maridos inconformados com a separação. Hoje desacreditada pela Lei Maria da Penha, essa tese serviu para abrandar a pena de alguns assassinos de mulheres, como o famoso playboy Doca Street, que matou a tiros a socialite mineira Ângela Diniz.


Essa escalada de violência contra as mulheres foi tão intensa que motivou protestos por todo o país, dando origem ao slogan “Quem ama não mata” e mobilizando pessoas de todas as classes sociais para que se estabelecesse um marco legal de proteção da mulher contra a violência doméstica e os criminosos passionais.


Ao longo desses 30 anos, a pílula anticoncepcional foi se modificando: deixou de ser a “bomba hormonal” do início dos anos 1970 e passou, com menos efeitos colaterais, a ter maior eficácia nos efeitos contraceptivos.

terça-feira, 1 de junho de 2010

Cena incomum, de um casamento muito comum...

A mulher contemporânea precisa ser compreendida em sua sensibilidade feminina para permanecer feliz ao lado do parceiro. Necessita de atenção e elogios, precisa ser percebida em seus pormenores, em suas variações, em sua potência.


Veja como essa característica feminina foi surpreendentemente retratada pelo diretor Ivan Attan e escritor Olivier Lecot nesta cena do filme de 2008 New York, I love you (no Brasil, Nova Iorque, eu te amo).